sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Poema sem tema

talvez eu fale aqui desta minha ansiedade ortomolecular
ou dos restos mortais
daquelas fotografias cravejadas de olhares
das abstinências que sobem por paredes escorregadias
e congelam resquícios de lucidez
ou, quem sabe, de simples amores de prateleira

talvez resolva apenas pendurar duas gotas de sal neste cadarço
antes de amarrar minhas mãos e desatar a minha língua
aparar a grama enquanto rolam ilusões
redefinir conceitos inexistentes
realçar bocas pintadas de libido
resolver equações geométricas
ou pequenas questões de física quântica

queria mesmo era escrever um poema sem tema
dizer das impurezas de verdades inconcebidas
desacreditar da necessidade pragmática da escrita
rimar palavras pobres com idéias ricas
deslizar alguns símbolos gráficos sobre o branco
manchando-o com frivolidades incontestáveis
rifar pensamentos inúteis
e apenas
fluir

CELSO MENDES 
Junho de 2010 

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Tons & Segredos


FRIO
o que se esconde 
na umidade das costas
senão o frio que paira
por detrás de todos
os rubores?
CALOR
o espaço a que se destina a paixão
descansa sobre brasa
aconchega-se em fogo insano
imprime-se nos olhos
assume-se nos caldos ebulientes e solitários
a se completarem


SEGREDO
leves são os passos do azul
a deslizar suave
na imensidão gelada

abriga do vento cortante
seu calor
seu segredo escarlate
MERGULHO
neste voo  surdo
cego pelo brilho
da escuridão
do porvir
persisto
sol

mergulho
vida

[teimosamente]



CELSO  MENDES

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Relatório de mais uma tarde


pingos de luz
gota
a gota
fabricam cor
indiferentes
à dor

alegria que me afronta
a escorrer paredes

num eu
ferido
o leve
sorriso

e a tarde sucumbe
às sombras
pinceladas
de vida


(Celso Mendes)

domingo, 15 de janeiro de 2012

A escuta

Hoje estou no blog do Bar do Escritor com um poema reeditado e modificado, anteriormente intitulado "Iluminado", que bebeu um pouco demais no boteco e trançou palavras e versos, perdendo alguns e ganhando outros.

http://bardoescritor.blogspot.com/2012/01/escuta.html

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Conteúdo

tenho comigo o ruído das horas que plantei
–  eternas e imutáveis –
algumas folhas  secas que me esqueci de regar
frutos [talvez alguns]
alguns cacos à vista e à deriva
um tanto de inocência verde de criança
e o fogo mais puro de cada desejo
junto aos meus rubros

tenho cá dentro as águas
rios de sal
e o sol que conservo no peito

circulo o sal nas artérias
brotam-me pedras de sal
salgo horizontes
mas guardo o sol e a lembrança das águas
intactos

já pude sentir o hálito do voo
provei da terra da poeira e do musgo do rastro
aprendi um pouco das estrelas na nudez da escuridão
procuro compreender o sábio valor
do ruflar silencioso da rocha
do pensamento etéreo das plantas
da clara mensagem das nuvens

só nada sei das entranhas
onde o peso da luz não se sente na língua emudecida
da palavra indecifrável

carrego
brisas
ventanias
tempestades
olhares
lábios
cânticos
e amanheceres

que sempre esperam as inevitáveis noites
e o definitivo sono que me contém

(Celso Mendes)